VISÃO SOCIAL E LEGAL DO CIRCULO DA ABUNDÂNCIA
TEAR DOS SONHOS
Vivemos em uma época de crescentes liberdades, na chamada “Era dos Direitos”. Uma leitura da Constituição Federal de 1988, em especial de seus artigos 5º e 6º denota tal amplitude na oferta de “liberdades” por parte do Estado brasileiro.
O princípio geral do direito “liberdade” e se refere às chamadas “liberdade econômica” ou “de iniciativa econômica” previstas no artigo 1º, inciso IV, da CF/88.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
…
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
Como um dos princípios gerais da ordem econômica no Brasil, trata-se da possibilidade de exercer qualquer atividade econômica com a menor restrição possível por parte do Estado, respeitados os limites constitucional ou legalmente previstos.
Muito ligado à liberdade de expressão (de forma coletiva) e ao sistema democrático de governo, em âmbito internacional, o direito à livre associação foi reconhecido pela primeira vez na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu artigo XX, corroborado pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, em seus artigos 22 e seguintes.
Em especial aquele que exerce uma atividade econômica precisa de um norte para se auto-organizar e combinar os diversos fatores de produção à sua disposição para mais bem tomar suas decisões. Liberdade e legalidade são princípios caros a todo particular que venha a adentrar em uma determinada sociedade. É nesse equilíbrio entre liberdades e limites que se encontra o verdadeiro balizamento para o exercício de qualquer atividade.
O direito de associação resume-se ao reconhecimento de que os particulares poderão explorar atividades econômicas, que são garantidas e limitadas tanto na CF/88 quanto em normas infraconstitucionais e autorregulatórias. Há, assim, uma perspectiva constitucional que deve ser considerada para regular os interesses dos agentes econômicos (pessoas físicas ou jurídicas).
A liberdade de associação e de reunião estão inseridas na categoria dos direitos coletivos, sendo espécies de liberdade individual que se expressam coletivamente. Esses direitos são assim enquadrados, pois propiciam aos indivíduos, agrupados em função da pluralidade – tendo como fator de ligação um pensamento ou ideal em comum –, o exercício dos seus direitos individuais dentro de uma coletividade (SILVA, 2014, p. 261).
Primeiramente introduzida como direito fundamental na Constituição de 1891, repetida nos textos constitucionais subsequentes, as liberdades estão previstas no artigo 5º e seus incisos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
[…]
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
[…]
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
[…]
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; […]
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
Falando-se propriamente do Tear dos sonhos, temos como base os direitos de liberdade associativa e também liberdade de reunião, muito embora o tear seja algo muito mais amplo, que não se encaixa especificamente dentro do sistema em que vivemos.
Trabalha-se no tear com uma reunião de mulheres que buscam promover uma economia colaborativa/compartilhada entre si.
A economia do compartilhamento está mudando não só o modo como entendemos oferta e demanda e a nossa relação com os bens materiais, mas também nossas relações pessoais.
É como se a tecnologia que em algum momento nos afastou, agora estivesse nos colocando de volta para um movimento em que nos comportamos como uma vila, porém com laços que acontecem em escala global. A reputação volta a ter uma importância outrora esquecida, os nossos valores mudam e conhecer pessoas no meio desse caminho torna a experiência ainda melhor.
De tempos em tempos novas revoluções emergem, revoluções capazes de mudar tudo, do modo como trabalhamos ao modo como nos relacionamos. Estamos no centro de uma mudança de era e qualquer reflexão feita hoje, pode fazer menos sentido amanhã. Por isso, para não insistirmos em modelos obsoletos o melhor é enxergar as oportunidades que a economia do compartilhamento nos dá para não só sobrevivermos, como sairmos ainda melhores das crises econômicas que vem colocando em xeque o modo como entendemos os mercados e a economia.
Conceituar economia colaborativa é bem simples, porque são redes de pessoas que se conectam diretamente para resolver problemas ou para criar soluções inovadoras, sem depender de instituições centralizadas e hierárquicas. E esse é o verdadeiro poder da Economia Colaborativa: a exponencialidade. Derivada do modelo no qual a colaboração está ancorada: as redes distribuídas.
Aqui não importa a distância existente entre os nós e nem mesmo a quantidade deles. A exponencialidade dá-se pelo grau de interação entre eles. É óbvio que a imagem acima não consegue representar a quantidade de conexões possíveis entre cada indivíduo (nó).
Vamos então às bases principais da Economia Colaborativa:
1. Propósito: aqui não se deve pensar em UM propósito específico e sim, propósitos da alma e do coração. Soa infantil, utópico e inacessível? Acostume-se. O fazer por fazer está com os dias contados. Em substituição vem o fazer para mudar a si mesmo, e consequentemente o mundo e a sociedade.
2. Confiança: o resgate de relações mediadas pela confiança é 100% presente no modelo colaborativo. Somente ações Ganha-Ganha conseguem sobreviver nos ambientes em plena colaboração. O indivíduo é respeitado pelo que é e não pelo que tem, pois o SER torna-se muitos mais visível e agregador do que o TER.
3. Comunidades: estão principalmente baseadas nas afinidades e valores, se dão naturalmente em escalas pequenas e de proximidade e o modelo governamental predominante é o democrático.
4. Conexões/Interatividade: sem conexões e trocas não existe colaboração. O prefixo ‘co’ por si só significa “fazer junto”. Aqui o indivíduo tem sua importância como cocriador, entretanto, a cocriação ao final da jornada é proveniente do coletivo e da colaboração. Nesse modelo, uma andorinha sozinha não faz verão!
5. Exponencialidade/Escalabilidade: alguém tem uma ideia/iniciativa apresenta para o fulano que indica o ciclano que por sua vez relata para o primo que divulga para a amiga… E essa rede não para e segue conectando pessoas que enriquecem a cada interação ainda mais a iniciativa. Não existem limites. Quando você se dá conta, já se alastrou.
6. Intangibilidade: os recursos intangíveis não se findam e são a base da economia colaborativa. Conhecimento, experiência, relações pessoais são infinitos e consequentemente intangíveis e sustentáveis. A colaboração tem o poder de transformar a intangibilidade em tangibilidade de uma forma mais dinâmica e perspicaz.
7. Abundância: a competição não é estimulada, pois retrata um ambiente de escassez, no qual tem-se a ilusão de que não existe disponibilidade de recursos tangíveis ou intangíveis para todos. Através desse desestímulo, cria-se um ambiente abundante que através da autorregulação consegue prover 100% os recursos necessários para toda a rede envolvida.
Michael Sandel, em sua apresentação “Por que não deveríamos confiar nossa vida cívica aos mercados”, enuncia:
O que é importante é que as pessoas de diferentes origens sociais e diferentes tipos de vida, se encontrem umas com as outras, colidam umas contra as outras no curso comum da vida. Porque é isso que nos ensina a negociar e respeitar nossas diferenças. É assim que começamos a nos preocupar com o bem comum. E então, no final, a questão dos mercados não é principalmente uma questão econômica. É uma questão sobre como queremos viver juntos. Queremos uma sociedade em que tudo está a venda ou há certos bens morais e cívicos que o mercado não honra e que o dinheiro não pode comprar? (vide vídeo youtube https://www.youtube.com/watch?v=3nsoN-LS8RQ)
Colaboração tem a ver com regulação e harmonização. Regular é totalmente diferente de controlar, pois diretrizes são estabelecidas reconhecendo-se que o caos é inerente do Universo que todos habitamos. Entretanto, os direcionamentos tem como objetivo harmonizar pessoas e ambientes para que se tornem terreno fértil para a criatividade, autodesenvolvimento e materialização de iniciativas transformadoras.
Como disse Richard Fuller:
Você nunca muda coisas brigando com a realidade existente. Para mudar algo, construa um novo modelo que torne o existente obsoleto.
Entretanto, como a economida de compartilhamento ainda é nova e traz muitas dúvidas necessário se faz analisarmos juridicamente as comparações efetuadas entre ela e esquemas fraudulentos de obtenção de vantagens financeiras (pirâmides).
O TEAR DOS SONHOS utiliza um sistema de DOAÇÕES MÚTUAS E VOLUNTÁRIAS. É LÍCITO, como se pode constatar no Código Civil brasileiro:
Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.
Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.
Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.
Nosso movimento se encaixa no parágrafo único, do artigo 541 do Código Civil, ma vez que “dinheiro em espécie” é bem móvel. Da mesma forma, o valor do regalo (U$ 1,440.00) enquadra se perfeitamente no conceito de “pequeno valor”, uma vez que, de acordo com a construção jurisprudencial do nosso país, esse tipo de doação não poderá ultrapassar 30% do patrimônio do doador.
Todas as mulheres que participam do TEAR DOS SONHOS têm ciência de que não há obtenção de vantagem ilícita, nem para o tear e tampouco para si ou qualquer outra pessoa. Também não há prejuízo, indução a erro ou falsa ideologia que afete qualquer pessoa.
Nosso sistema é bastante simples e LEGAL, embora muitos achem que seja ilegal. Outros vão mais longe ainda e dizem se tratar de "Crime Contra a Economia Popular", “Estelionato/Fraude", "Enriquecimento sem causa" e “lesão a terceiros”. Mas qual é a verdade?
• CRIME CONTRA A ECONOMIA POPULAR:
Vamos analisar a Lei 1521 de 26/12/1951 que trata de "Crimes Contra a Economia popular". Vejamos o que diz o Inciso IX do Artigo 2° desta lei:
Art. 2°. São crimes desta natureza: I - (...) IX - obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos ("bola de neve", "cadeias", "pichardismo" e quaisquer outros equivalentes);
O simples fato de nós, mulheres empoderadas, estarmos nos apoiando financeiramente de forma mútua, numa economia compartilhada, não caracteriza Crime Contra a Economia Popular conforme descrito acima. Especialmente, porque todas as mulheres que entram para o TEAR são devidamente esclarecidas de todo o processo que lhes envolve, e decidem por livre e espontânea vontade aderir e permanecer no movimento. Além disso, todas entram com o mesmo valor e recebem o mesmo valor. Somos todas iguais!
Por fim, é muito importante deixar claro que o TEAR não é investimento, não é negócio! É um movimento onde as mulheres (mulheres fogo) DOAM o valor de U$ 1,440.00 (dólares) diretamente a outra mulher (mulher água). Esse valor não passa por intermediários e nem é necessário assinar qualquer tipo de documento ou recibo, nem repassar “comissões” a quem te convidou (mulher vento).
Trabalhamos com o coração e confiança umas nas outras!
• ESTELIONATO/FRAUDE:
O Artigo 171 do Código Penal (Decreto Lei N° 2448 de 07/12/1940), diz o seguinte:
Art. 171: Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
Não há muito que se dizer aqui.
- Onde está o "Meio Fraudulento" da Economia Colaborativa que gira em torno do TEAR? - Não há, pois tudo está explicado claramente a todas as participantes.
- Onde está a ilicitude da Vantagem, visto que é cooperação cumulativa? - Não há !
- Onde está o prejuízo alheio? - Não há, pois todas nós entramos no TEAR cientes de todos os nossos compromissos e responsabilidades.
Nenhum dos elementos normativos, objetivos ou subjetivos do estelionato/fraude se enquadra neste sistema. Logo, não é estelionato ou fraude.
Muito importante arrematarmos esse item afirmando que NENHUMA MULHER ENTRA POR COAÇÃO OU AMEAÇA. Ninguém é forçado a entrar ou a permanecer. Toda a mulher que entra no TEAR entra porque acredita, porque sente a necessidade de mudar algo em si e no mundo! Não há indução a erro ou vantagem ilícita de um em detrimento do outro.
• ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA:
Artigo 884 do Código Civil (Lei 10.406 de 10/01/2002), diz:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
O enriquecimento sem causa é a situação na qual um indivíduo aufere vantagem indevida em face do empobrecimento de outro, sem causa que o justifique. Todo ganho tem de ter uma causa; caso contrário, a lei veda. No entanto, existe a instituição da "doação" que permite que cada um doe qualquer valor por sua livre e espontânea vontade, sem ser coagido a nada.
Aqui é importante frisar mais uma vez que as doações efetuadas são DIRETAS e do MESMO VALOR. Cada uma que entra doa e recebe a mesma importância, não havendo que se falar em enriquecimento de uma em detrimento de outra.
∙ LESÃO:
Artigo 157 do Código Civil (Lei 10.406 de 10/01/2002):
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
Trata-se de um vício do consentimento que se configura quando alguém obtém lucro manifestamente desproporcional ao valor real do objeto do negócio, aproveitando-se da inexperiência ou da premente necessidade do outro contratante, o que pode ser colocado em dois elementos: um objetivo e um subjetivo.
As participantes do TEAR não estão lesionando ninguém, uma vez que não há contrato ou contraprestação dentro deste movimento. Como se trata de DOAÇÃO VOLUNTÁRIA e que todas passam por todos os elementos e recebem os mesmos presentes, não há que se falar em vício de consentimento ou lucro desproporcional de uma para com a outra.
Portanto, o TEAR DOS SONHOS, que alguns chamam de "corrente" ou "pirâmide", não é ilegal. É PERFEITAMENTE LEGAL, e pode-se participar do projeto sem qualquer receio.
Como visto por tudo o que explanamos até aqui, temos direito HUMANO de nos reunir pacificamente em prol de alguma causa comum a todas! A ajuda entre mulheres é lícita, nosso grupo não engana para obter lucros, em consequência não cometemos fraude; temos direito a decidir o que fazemos com nossos recursos pessoais e individuais e NÃO EXISTE disposição legal alguma que nos proíba desse movimento ou de formar parte deste círculo e, em consequência, ninguém têm a capacidade legal para nos perseguir por isso.
Temos direito de nos manifestar contra quem nos difama e ameaça sem sustento legal (vide crimes de calúnia, difamação e injúria previstos nos artigos 138 e sgts do Código Penal Brasileiro).
Até agora nenhum dos indivíduos que acusam o Telar dos Sonhos tem referido juridicamente qual seria a ilegalidade do nosso movimento. Isso nos leva a concluir que estamos, de fato, revolucionando o sistema econômico de um país, que não quer que nós, mulheres, tenhamos uma visão própria as coisas.
“Empoderamento feminino é o ato de conceder o
poder de participação social às mulheres, garantindo
que possam estar cientes sobre a luta pelos seus
direitos. Também conhecido como “empoderamento
das mulheres”, esta ação consiste no
posicionamento das mulheres em todos os campos
sociais, políticos e econômicos”.